Convivendo com o infortúnio de encarnados e desencarnados por muitas décadas, o médium Chico Xavier comentou que “tudo passa, mas o remorso faz com que o tempo pare dentro da gente. O relógio não espera ninguém, mas a consciência culpada se recusa a avançar”. O caso seguinte comprova esta afirmação. Começa com uma manifestação psicofônica havida ao final da reunião de 13 de maio de 1954, no Centro Espírita Luiz Gonzaga, na cidade de Pedro Leopoldo, Minas Gerais. Usando a mediunidade de Chico, comunicou-se um Espírito identificado apenas pelas iniciais J.P. que, curiosamente, ligava-se a uma das integrantes do grupo ali presente, a qual, meses antes da mensagem, revelava todos os sintomas de uma gravidez aparente e dolorosa, tendo sido tratada espontaneamente em várias reuniões sucessivas por um dos Benfeitores Espirituais que, carinhosamente, a libertou, através de passes magnéticos, das estranhas impressões de que se via possuída. Com grande surpresa para todos, soube-se que o Espírito J.P., era o candidato ao renascimento que não chegou a positivar-se. A história de J.P. talvez possa ser iniciada pela noite/madrugada de março de 1866, após o mesmo ter retornado de uma reunião de que participara na Câmara Municipal de Vassouras (MG), a convite de amigo pessoal para tratar de assunto que lhe era inteiramente desagradável: “a adoção de medidas compatíveis com a campanha abolicionista, então na culminância”. Admitindo que o negro havia nascido para o eito, não cogitando de concessões nem transações, apoiado por outros que lhe partilhavam das opiniões, viu sua causa vencedora, em meio a acalorados debates. Retornando à sua propriedade, todavia, tomou conhecimento que a inspiração da providencia sugerida partira inicialmente de um dos servos de sua casa, Ricardo, a quem presumia dedicar sua melhor afeição. A ele se ligara desde pequeno por profunda simpatia por sua inteligência invulgar, propiciando-lhe condições de uma formação esmerada que o tornara hábil tradutor do francês. Afeiçoado ao rapaz, tornara-o companheiro, confidente, amigo, tudo, reconhecia hoje, por implacável egoísmo, por admirar-lhe as qualidades inatas, aproveitando-lhe o concurso, como quem se reconhece dono de uma animal raro, querendo-o como se não passasse de mera propriedade sua. Enraivecido, disposto a castiga-lo apesar do horário, determinou sua imediata prisão, contra a qual não houve nenhuma resistência e, após interrogatório encarado com calma, resignação e bondade, que só fez atiçar a ira do que se julgava seu senhor, ordenou que a prisão no tronco fosse transformada em suplício comandado através de gritos, para que sua gente por meio de violentas pancadas, dilacerassem o dorso nu de Ricardo que, apesar do jorro abundante de sangue, mergulhara em lacrimoso silêncio. À face daquela resistência tranquila, induziu o capataz a massacrar-lhe mãos e pés, recomendação imediatamente cumprida, após o que os grilhões foram dasatados. Recorda J.R., que “aquele homem, que parecia guardar no peito um coração diferente, ainda teve forças para arrastar-se, nas vascas da morte e, endereçando-me inesquecível olhar, inclinou-se à maneira de um cão agonizante e beijou-me os pés”... Acrescenta “não haver quem possa compreender o martírio de um Espírito que abandona a Terra, não posição em que deixei. Um pelourinho de brasas que me retivesse por mil anos sucessivos talvez me fizesse sofrer menos, pois desde aquele instante a existência se me tornou insuportável e odiosa”. Sem noção de tempo, em dado instante, na treva em que se debatia, a voz de Ricardo se fez ouvir aos seus pés: -Meu filho!..Meu filho!...Conta que “num prodígio de memória, em vago relâmpago na escuridão de minh’alma, recordei cenas que haviam ficado a distância, quadros que a carne da Terra havia conseguido transitoriamente apagar. Com emoção indizível, vi-me de novo nos braços de Ricardo, nele identificando meu próprio pai, meu próprio pai que algemara cruelmente ao poste de martírio e a cuja flagelação eu assistira, insensível, até ao fim... Não posso entender os sentimentos contraditórios que então me dominaram... Envergonhado, em vão tentei fugir de mim mesmo. Em desabalada carreira, desprendi-me dos braços carinhosos que me enlaçavam e busquei a sombra, qual o morcego que se compraz tão somente com a noite, a fim de chorar o remorso que meu pai, meu amigo, meu escravo e minha vítima não poderia compreender. No entanto, como se a Justiça, naquele momento, houvesse acabado de lavrar contra mim a merecida sentença condenatória, após tantos anos de inquietação, reconheci, assombrado, que meus pés e minhas mãos estavam retorcidos. Procurei levantar-me e não consegui. A Justiça vencera”. O testemunho de J.R. prossegue, narrando outras desventuras que experimentou a partir daquele dia, provocadas por cativos que lhe conheceram a truculência, até que, décadas depois, no calendário de nossa Dimensão, começasse a ser preparado para nova reencarnação a se efetivar em breve, possibilitando-lhe expiar o tenebroso e triste passado.
É
muito difícil para a gente não se revoltar, quando vê o sofrimento e a agonia
de crianças inocentes. Cenas chocantes de criancinhas vítimas da guerra e de
terremotos, banhadas de sangue ou com os olhos estalados de fome, como a
televisão costuma mostrar, são tão violentas e cruéis que mexem com a gente,
deixando a impressão que Deus não se importa com elas ou, até mesmo, que Deus
não existe.
Com certeza, não existe nada tão chocante aos olhos humanos do que o
sofrimento de uma criança. Se o sofrimento do adulto nos comove, o de uma
criança pode até nos revoltar.
Diante dessa realidade, quando vemos o
sofrimento de uma criancinha ensanguentada, macerada, retirada de escombros
quase sem vida, é natural que perguntemos: por que isso, meu Deus?
Que fez uma criança para merecer tamanho
castigo? O que se esconde atrás desse fato terrível, que comove o coração mais
endurecido?
Se nós humanos – que somos maus e
imperfeitos, que choramos diante do inevitável, por que Deus – que é o Pai
poderoso, bom e perfeito – ainda usando as palavras de Jesus – permite que isso
aconteça?
Não muito tempo atrás, ao visitar o campo de concentração Auschwitz, na Polônia, o
Papa Bento XVI, onde aconteceram as maiores atrocidades contra os judeus,
exclamou: “Onde estava Deus naqueles momentos?”
Seria absurdo pensar que Deus, um Pai bom e
amoroso, não estivesse presente em algum lugar ou mais precisamente no lugar
onde inocentes são sacrificados; que Ele fosse responsável pelos sofrimentos e
atrocidades humanas e nada fizesse para evitar.
Seria mais do que contraditório afirmar que o
sofrimento e a agonia de uma criancinha indefesa acontecesse simplesmente
porque Deus quer que assim seja.
Isso nos faz lembrar um episódio da vida de um
jovem americano que, diante do silêncio da mãe para explicar a morte cruel e
sofrida de um bom amigo, afirmou: “Se
esse Deus quer assim, mãe, melhor que Ele não existisse”.
No entanto, podemos afirmar que esse Deus indiferente
ou ausente realmente não existe, e que o Deus que existe, aquele que Jesus
chamou de Pai, não tem nada com isso, porque, de acordo com suas Leis, todos
estamos aprendendo com os próprios erros.
Sem a crença na reencarnação, caros
ouvintes, não há como explicar e tampouco se conformar com os dramas humanos, sejam
de uma criança ou de um adulto. Sem a reencarnação, atribuindo a Deus os males
que nos acontecem no mundo, contradiz frontalmente a ideia de um Pai bom e
misericordioso, conforme Jesus ensinou.
Vendo esta vida como única, não vamos
entender os males que nos acontecem. Mas vendo a vida, pela ótica da
reencarnação, vamos entender que esta vida é apenas um pequeno trecho da longa
jornada do Espírito ao longo de sua caminhada evolutiva.
Logo, a criança que é retirada quase sem
vida dos escombros , aquelas que nascem com deficiências ou experimentam a dor
de uma doença insidiosa, todas elas, na verdade, apenas estão aprendendo a
viver, porque logo se libertarão desses terríveis constrangimentos, mas
continuarem na sua gloriosa jornada.
Isso, porém, não nos deve colocar apenas
na condição de meros espectadores, porque na Lei de Deus todos estamos sendo
convocados para todo momento a agir em favor do próximo para dar-lhe uma melhor
condição de vida.
Todos os males que nos acontecem,
portanto – quer sejamos crianças ou adultos – não procede da vontade de Deus,
mas dos equívocos que já cometemos ou de nossas próprias necessidades
evolutivas.


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