Shabi, na verdade José Roberto Pereira Cassiano, retornava de Santos onde deixara a namorada Beth, quando um acidente de trânsito mudaria a direção de seu destino, ou seja, o apartamento em que vivia com os pais na região da Avenida Paulista, em São Paulo. Não tendo carro, fazia uso do serviço de transporte através de automóveis oferecido pelo Expresso Luxo, bastante conhecido nos anos 70, quando as linhas de ônibus e seus horários não eram tão disponíveis quanto hoje. Filho único, 23 anos, profissional autônomo, não percebeu que saíra de casa sem pegar seus documentos pessoais. Era o dia 9 de março de 1974, um sábado à noite, o trânsito na Via Anchieta intenso e, na altura de São Bernardo do Campo, deu-se o acidente que projetou Beto fora do veículo em que se encontrava, causando-lhe várias lesões, mas principalmente, um traumatismo craniano apontado pelos legistas como a causa de sua morte física, ainda no local do sinistro. Um ano e nove meses depois, uma carta pôs fim ao calvário dos seus pais, iniciado pelos dias de demora do filho em retornar à sua casa, já que quando dela saiu para levar a namorada Elizabeth para Santos, onde ela residia, eles se encontravam ausentes, não tendo, portanto, sido informados do seu paradeiro. O tempo passando, contudo, só fez aumentar a ansiedade e preocupação, especialmente porque, contatada, Beth, informou-lhes sobre o momento em que se despediram para seu retorno à Capital. As horas se transformaram em seis dias, quando finalmente, uma exumação feita no corpo de um indigente sem documentos de identidade, sepultado em São Bernardo, pôs fim à traumatizante busca. Para desespero dos pais, era o corpo do adorado filho. Lágrimas misturadas à profunda revolta, transtornaram suas vidas nos intermináveis dias que se seguiram, até que, várias circunstâncias, fizeram com que no dia 20 de setembro de 1975, em reunião pública no Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, MG, finalmente os três corações se reencontrassem. Chico Xavier, mais uma vez se fez instrumento para que a continuidade da vida se confirmasse. Entre outras cartas recebidas naquela noite/madrugada, encontrava-se a de Shabi, impregnada de fortes emoções, confortando os sofridos pais, aos quais era muito ligado afetivamente. Em certo trecho, diz ele: “-Estou bem. Isso, queridos pais, é tão pouco e, no entanto, diz tudo, porque na essência, quero explicar que todas as aflições passaram”. Lembrando o acidente conta: “- A viagem seguia o compasso da Anchieta entre paradas de trânsito, marchas rápidas para ganho de tempo, quando ao movimentar-me cai num impacto de forças, mas tive a impressão que um suave anestésico me entorpecia as forças mentais. O pensamento escorria do cérebro como se fosse sangue a derramar-se de outros campos do corpo... Sensação estranha de esvaziamento, compelindo-me a desfalecer, sem recursos de resistência. E dormi. Pelo menos foi esta a convicção que me ficou na memória ao despertar... Conflitos e providência, toques e chamamentos, em torno de mim, pareciam pesadelo no qual mergulhava cada vez mais até que entrei num nível de inconsciência profunda. Acordei, queridos pais, numa sala de apresentação muito difícil com as palavras das quais consigo dispor”. A sala a que se refere era do Necrotério Municipal de São Bernardo do Campo. A pesquisa que fizemos nas mais de seiscentas cartas psicografadas por Chico Xavier, demonstra que esse despertar não segue padrão estabelecível, visto que, apesar do desligamento do corpo espiritual do corpo físico, consumir em média 50 horas, as percepções são diferentes em cada pessoa, estando vinculadas a méritos, débitos e carmas de cada um. Seguindo, Shabi acrescenta: “- Era eu e não era eu quem se achava ali numa dualidade que não podia reconhecer. Ouvi conversações e apontamentos que me espantavam. No entanto, médicos e enfermeiros me administram agentes sedativos que me impuseram mais descanso”. Como o corpo físico de Shabi já não tinha vida, conclui-se que tais sedativos e o acompanhamento pelos especialistas citados, já faziam parte da realidade do Plano Espiritual. Continuando, “em meio daquela penumbra da mente, em que todas as formas se expressavam desfiguradas ao meu olhar, acreditei-me acidentado e, por isso mesmo, doente... Com muito esforço pronunciava os nomes de vocês dois, rogando para que me buscassem, até que um amigo, o Irmão Cassiano, amorável Benfeitor, à feição de um pai a tutelar-me, explicou que representava a nossa família, a recomendar-me tranquilidade e confiança. A presença de semelhante protetor me acalmava... A situação prosseguia, quando o Irmão Cassiano me avisou que traria meus pais para um reencontro. Daí a instantes, notei-lhes a presença quase rente a mim. Mãezinha e você, papai, pediam notícias minhas”. Lembrando a desesperada busca por informações do filho desaparecido, sua mãe conta que, “na quarta-feira, 13 de março, com o marido, retornavam de Santos, já tarde da noite, debaixo de chuva torrencial. Na altura de São Bernardo, não sei por que, quis entrar na cidade e fomos até o necrotério, mas, como em todos os lugares, recebemos informações erradas, e voltamos para casa sem saber que, naquele dia, nosso filho havia sido sepultado”. Esse “não sei por que”, certamente corresponde à ação do amigo espiritual que, pelo sem fio do pensamento, intuiu a mãe da Shabi, já que, como revelado por Allan Kardec na questão 459 d’O LIVRO DOS ESPÍRITOS”, ‘os Espíritos influenciam em nossos pensamentos e atos muito mais que imaginamos e, invariavelmente, eles nos conduzem’. Prossegue Shabi: “-Só então entendi que me achava em São Bernardo, não longe do quilometro em que havia sofrido a queda. Compreendi mais: aquele não era um recinto de hospital, mas um refúgio de paz e silêncio, reservado aos que já haviam atravessado as fronteiras, das quais me vejo agora muito aquém... Fiz tudo para fazer-me sentir, a fim de tranquiliza-los. Mas, o amigo fiel que me assistia e ainda me protege, (...) me sossegou o espírito atribulado, afirmando que estavam dados os primeiros passos para que recebessem minhas notícias. A ideia da despedida então tomou corpo em mim e só aí, querida mamãe, compreendi que seu filho havia deixado a veste física, à feição de alguém que se transfere de estrada ou de carro a fim de tomar caminhos diferentes. Confesso, meu pai, que as lágrimas me subiram do coração para os olhos, porque não me sentia preparado quanto agora para o exame do assunto”. A longa carta de Shabi, revela ainda que, levado pelo Benfeitor que o assistia, acompanhou todas as providências que culminaram na localização de seu corpo, e, na continuidade do tempo, testemunhou dos bastidores da invisibilidade o enredo da história da vida dos seus queridos pais, descrevendo pormenorizadamente tais acontecimentos, conforme publicado no livro FILHOS VOLTANDO (geem), atestando que a vida continua além da morte.
Lemos
no livro QUEM TEM MEDO DOS ESPÍRITOS, de Richard Simonetti, que “A inversão
sexual resulta também de expiação, envolvendo Espíritos comprometidos em abusos
sexuais”. Pergunto: O que devemos entender por abusos sexuais? (C.A.)
A palavra “abuso”, segundo os dicionários de Língua Portuguesa, quer
dizer “mau uso”, e o mau uso, seja do que for, só pode causar danos, materiais
e/ou morais aos autores e às vítimas.
O dano, insistimos, geralmente atinge o
próprio autor ou autora do abuso, como pode atingir terceiros, de modo que a
dimensão do estrago pode ser muito grande.
Geralmente, por causa da visão arcaica e
autoritária da religião, o sofrimento humano tem sido atribuído a castigos de
Deus, como se Deus permanecesse o tempo todo nos vigiando para nos flagrar em cada
erro que cometemos e, assim, desferir sobre nós a sua ira.
Esta visão ou esta concepção de Deus é absurda,
pois, segundo o preceito de Jesus que diz “a cada um segundo as suas obras”, todos
nós respondemos pelos atos que praticamos. É o princípio da lei de causa e
efeito que regula nosso comportamento.
Além disso, o abuso, que podemos
praticar, pode ocorrer em qualquer área da experiência humana e uma delas é a da
sexualidade, muito presente nos noticiários da mídia.
É por isso que sempre existiram abusos,
principalmente contra a mulher e os menores, quando passam a ser vítimas de
atos abomináveis, como o estupro e o comércio vergonhoso da pornografia
infantil, que hoje se vulgarizou pela internet.
A legislação humana tem procurado coibir
todo tipo de violência sexual, mas, apesar disso, muitos desses abusos passam
despercebidos ou ignorados e não são atingidos pela lei.
Se isso acontece hoje, em pleno século
XXI, o que não teria acontecido no passado? E quando mais passado, pior. A
mulher, a criança, os transexuais inclusive, sempre foram alvos de toda sorte
de violência nesse sentido.
Mas, por outro lado, sabemos que a
justiça humana ainda é muito imperfeita e que as verdadeiras consequências
virão no futuro de cada um dos abusadores, na maioria das vezes, em futuras
encarnações.
Algumas vezes, experiências sofridas no
campo da sexualidade, seja para os transexuais ou mesmo para os heterossexuais,
provêm de repercussões dos abusos de existências passadas, que redundaram em
muito sofrimento para os outros.
Indivíduos que abusaram sexualmente da
mulher ou violentaram impiedosamente crianças indefesas, por exemplo, eles
próprios – depois do arrependimento e do remorso na espiritualidade – podem
pedir para enfrentarem na próxima encarnação problemas ligados ao sexo.
E nós não temos dúvida que, por
enquanto, a sociedade ainda é um campo propício ao sofrimento. Ela ainda está
muito distante de tratar a questão sexual de forma prudente e equilibrada.
Haja vista que até
hoje os transexuais são rejeitados e, por isso, vêm sofrendo incompreensão e
intolerância, que acabam se convertendo em crimes de homofobia.
Diante disso, acreditamos que a opinião
de Richard Simonetti, quando se refere a inversões sexuais, sejam no sentido de
mostrar que muitas situações em que o indivíduo sofre rejeição, perseguição e
até violência física, em razão da ignorância da sociedade, podem se constituir
em provas ou expiações.
Passar pelas mesmas situações que a
vítima de outrora passou, sofrer as mesmas agruras a que foram submetidas no
passado, pode ser uma forma do culpado pagar pelo que fez diante de sua própria
consciência.
É claro que nosso papel, como espíritas,
não é o de apontar pretensos culpados, até porque não temos autoridade moral
para isso, razão pela qual os abusos do passado reencarnatório sempre
permanecem encobertos pela cortina do esquecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário