O Espírito André Luiz considera que, excetuando-se determinados casos de mortes em acidentes e outros casos excepcionais, em que a criatura necessita daquela provação, ou seja, o sofrimento intenso no momento da morte, esta de um modo geral não traz dor alguma porque a demasiada concentração do dióxido de carbono no organismo determina anestesia do sistema nervoso central. Explica que o fenômeno da concentração do gás carbônico alteia o teor da anestesia do sistema nervoso central provocando um fenômeno que eles chamam de acidose. Com a acidose vem a insensibilidade e a criatura não tem estes fenômenos de sofrimento que imaginamos”. Embora a resposta tenha sido dada pelo médium Chico Xavier em esclarecedora entrevista quando da realização da pioneira cirurgia de transplante de coração realizada em 1968, no Brasil, certamente pode servir para avaliarmos a questão da cremação introduzida no lado Ocidental da Terra, através da Europa, no início do século 20, visto que na milenar e Oriental Índia faz parte das tradições do Bramanismo, atual Hinduísmo. Consultado em 1935 sobre o assunto, o Espírito Emmanuel, esclareceu, contudo, que a mesma “nunca deverá ser levada a efeito antes do prazo de 50 horas após o desenlace”, considerando que “a cremação imediata ao chamado instante da morte é, portanto, nociva e desumana”. Compreende-se porque através da explicação de Allan Kardec sobre experiência da morte: -“Por ocasião da morte corpórea, o Espírito, entra em perturbação, e, perde a consciência de si mesmo, de sorte que jamais testemunha o último suspiro do seu corpo. Pouco a pouco a perturbação se dissipa e o Espírito se recobra, como um homem que desperta de profundo sono. Sua primeira sensação é a de estar livre do fardo carnal; segue-se o espanto, ao reparar no novo meio em que se encontra. Acha-se na situação de um a quem se cloroformiza para uma amputação e que, ainda adormecido, é levado para outro lugar. Ao acordar, ele se sente livre do membro que o fazia sofrer; muitas vezes, procura-o, surpreendido de não mais o possuir. Do mesmo modo, o Espírito, no primeiro momento, procura o corpo que tinha; descobre-o a seu lado; reconhece que é o seu e espanta-se de estar dele separado e só gradativamente se apercebe da sua nova situação. Neste fenômeno, apenas se operou uma mudança de situação material. Quanto ao moral, o Espírito é exatamente o que era algumas horas antes; por nenhuma modificação sensível passou; suas faculdades, suas ideias, seus gostos, seus pendores, seu caráter são os mesmos e as transformações que possa experimentar só gradativamente se operarão, pela influência do que o cerca. Em resumo, unicamente para o corpo houve morte; para o Espírito, apenas sono houve”. A reação diante do fato, porém, depende de cada um. O Espírito Irmão X, através do próprio Chico Xavier pondera: -“Morrer não é libertar-se facilmente. Para quem varou a existência na Terra, entre abstinências e sacrifícios, a arte de dizer adeus é alguma coisa da felicidade ansiosamente saboreada pelo Espírito, mas para o comum dos mortais, afeitos aos “comes e bebes” de cada dia, para os senhores da posse física, para os campeões de conforto material e para os exemplares felizes do prazer humano, na mocidade ou na madureza, a cadaverização não é serviço de algumas horas. Demanda tempo, esforço, auxílio e boa vontade”. No mesmo texto, indaga: -“Não seria justo conferir pelo menos três dias de preparação e refazimento ao peregrino das sombras para a desistência voluntária dos enigmas que o afligem na retaguarda?”. O extraordinário acervo constituído de mensagens-depoimento psicografadas pelo famoso médium demonstra a utilidade dessa precaução, prevista, por sinal, na legislação brasileira. De qualquer forma, oportuno considerarmos o comentário do Espírito Emmanuel: -“Mesmo que a separação entre o Espírito e o corpo não se tenha completado, a Espiritualidade dispõe de recursos para impedir impressões penosas e sofrimentos...”.
Este comentário veio de um senhor que resolveu se manter longe de qualquer religião; segundo ele, para se livrar do sentimento de culpa. “Quando criança aprendi que a gente peca por pensamentos, palavras e obras, e isso me deixou preocupado, porque eu imaginava Deus me vigiando o tempo todo, até mesmo quando eu ia ao banheiro, para saber o que estou pensando e assim me condenar por pensamentos que, muitas vezes, nem eu conseguia evitar. Esse sentimento de culpa ficou comigo por muito tempo, até que eu descobri que não podia mais acreditar nisso.”
Essa concepção de que cada um de nós é vigiado por Deus nas 24 horas do dia nasceu das antigas crenças religiosas que assim procuravam controlar o comportamento social. Ela está diretamente ligada à ideia de castigo divino, quando era ensinado que todo mal que a pessoa sofria era por conta dos deuses ou espíritos da natureza quando lhe reprovavam a conduta. Era assim com as epidemias, as tempestades, a seca, os terremotos, e todos os flagelos que atingiam não só o indivíduo, mas toda a coletividade.
Os estudos da antropologia assinalam a importância do referido período na história humana, até porque, nas primeiras experiências tribais, quem estabelecia as leis e a ordem eram os chefes religiosos ou sacerdotes, de modo que as condutas indesejáveis deveriam ser evitadas ou severamente castigadas. Mas, com o tempo, verificou-se que não era suficiente evitar determinadas práticas; era necessário vigiar e controlar também o pensamento das pessoas, para que elas se sentissem controladas o tempo todo.
Ora, com a chegada da civilização e a evolução do pensamento religioso, essa ideia de que Deus nos vigia o tempo todo passou a fazer parte dos mandamentos - uma forma de controle da sociedade, numa época em que o ser humano vivia sob o império da ameaça e do medo. Mesmo assim, sob a ameaça do castigo divino, quando lemos o antigo testamento da Bíblia por exemplo, vamos verificar como foi difícil para Moisés obter a obediência de seu povo.
Para o Espiritismo isso tudo é passado. Estamos no século XXI e já não dá para compreender Deus, armado até os dentes e sempre pronto a nos castigar por nossos erros e fraquezas. A doutrina de Jesus, na história do povo hebreu, marcou o rompimento com aquele antigo conceito de um deus severo e vingativo. Na verdade, aquele momento de Jesus, tão mal compreendido até hoje, representa o início de uma era do pensamento religioso no mundo ocidental, pois Jesus agora falava de um Deus-Pai, bom e misericordioso, e não mais de um deus severo e implacável.
Contudo, é importante dizer que esta postura do Espiritismo, em relação aos ensinamentos de Jesus, não nos exonera da reponsabilidade sobre nossos atos- sejam eles palavras, ações ou mesmo pensamentos. Mas essa responsabilidade não é cobrada como se cobra uma dívida qualquer, quando alguém, de fora vem exigir pagamento. Não. Ela surge de forma espontânea da reação da consciência moral de cada um quando fere um princípio da lei natural.
A moral espírita é uma moral autônoma; o Espiritismo diz que a cobrança não é de Deus, mas de nós mesmos, de acordo com o nosso amadurecimento espiritual: é a lei de Deus refletindo em nossa mente. Desse modo, o pensamento de prejudicar alguém ou de praticar um ato de desonestidade, por exemplo, mais cedo ou mais tarde, acaba gerando um conflito íntimo na pessoa, acompanhado de um sofrimento moral. Mas não é Deus que está nos apontando e, sim, a nossa própria consciência que já sabe distinguir o certo do errado.
Assim, em se tratando da lei divina, não existe um julgamento exterior (de fora para dentro), mas sim um julgamento que nasce da nossa própria intimidade, começando pelo arrependimento e pelo remorso e, depois, criando obstáculos que comprometem nosso mundo interior, com repercussão desagradável seja nesta, seja em vidas futuras. Quando vai acontecer isso? - você perguntaria.
Como dissemos, depende do nível de entendimento de cada um. Para aquele que já sabe que errou, a dor do arrependimento já começa imediatamente; para aquele que ainda não sabe reconhecer ou avaliar o erro que cometeu, a partir do momento que dele toma consciência. É comum acontecer alguns “insights” nesse sentido nos momentos que antecedem a morte ou logo após a desencarnação, quando naturalmente a mente faz um rastreamento e uma avaliação da vida.
Aquilo que se costuma chamar de castigo de Deus é crença do passado, um dogma que permaneceu através dos séculos, mas que conflita tanto com os ensinamentos de Jesus, do mesmo modo que a antiga lei de talião, do olho por olho, dente por dente, implantada por Moisés.
Sobre esta intrigante questão Allan Kardec faz um oportuno comentário sob o título “Pecado por Pensamento, Adultério” que vamos encontrar no capítulo 8º d’OEVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO. E ele finaliza seu comentário observando que, em nosso progresso espiritual, podemos nos achar em diferentes estágios evolutivos que assinalam diferentes condições morais em que se nos encontramos. Kardec diz o seguinte:
“Na pessoa que já não concebe o mau pensamento o progresso está realizado; naquela que tem esse mau pensamento, mas o repele, o progresso está em vias de realizar; naquela, enfim, em que a pessoa tem o mal pensamento e nele se compraz, o mal está ainda com toda a sua força”. E conclui Kardec ao final: “Numa o pensamento está feito, na outra está por fazer. Deus, que é justo, considera todas essas diferenças na responsabilidade dos atos e dos pensamentos o homem”.