Expositores, facilitadores, palestrantes costumam comentar o tema Expiação e Provas de uma forma diferente da comentada por Allan Kardec respondendo a indagação de seguidor do Espiritismo nascida em seu grupo de estudos na cidade de Moulllins, interior da França, sobre a Expiação ocorrer ou não durante a encarnação dos Espíritos, apoiando-se na expressão empregada em muitas comunicações. É na seção Questões e Problemas do número de setembro de 1863 da REVISTA ESPÍRITA, que se ocupa dos argumentos do consulente que se vale de “várias comunicações, dadas por Espíritos diferentes, qualificando indistintamente as expiações e as provas, males e tribulações que formam o quinhão de cada um de nós, durante a encarnação na Terra. Resulta - segundo ele -, nesta aplicação de duas palavras, muito diversas da significação, a uma mesma ideia, certa confusão, sem dúvida pouco importante para os Espíritos desmaterializados, mas que, entre os encarnados, dá lugar a discussões, que seria interessante fazer cessar por uma definição clara e precisa e explicações fornecidas pelos Espíritos Superiores, e que fixasse, de modo irrevogável, este ponto da Doutrina”. Opina Allan Kardec: -“A distinção estabelecida pelo autor da nota, entre o caráter da expiação e o das provas é perfeitamente justa. Contudo não poderíamos partilhar de sua opinião no que concerne à aplicação desta teoria à situação do homem na Terra. A expiação implica necessariamente a ideia de um castigo mais ou menos penoso, resultado de uma falta cometida; a prova implica sempre a de uma inferioridade real ou presumível, porque o que chegou ao ponto culminante a que aspira, não mais necessita de provas. Em certos casos, a prova se confunde, com a expiação, isto é, a expiação pode servir de prova, e reciprocamente. O candidato que se apresenta para receber uma graduação, passa por uma prova. Se falhar, terá que recomeçar um trabalho penoso; esse novo trabalho é a punição da negligência no primeiro; a segunda prova é, assim, uma expiação. Para o condenado a quem se faz esperar um abrandamento ou uma comutação, se se conduzir bem, a pena é ao mesmo tempo uma expiação por sua falta, e uma prova para sua sorte futura. Se, à sua saída da prisão, não estiver melhor, sua prova é nula e um novo castigo conduzirá a uma nova prova. Agora, se considerarmos o homem sobre a Terra, vemos que ele aí suporta males de toda sorte e, por vezes, cruéia. Esses matles tem uma causa. Ora, a menos que se os atribua a um capricho do Criador, é-se forçado a admitir que a causa esteja em nós mesmos, e que as misérias que experimentamos não podem ser resultado de nossas virtudes. Então tem sua fonte nas nossas imperfeições. Se um Espírito encarnar-se na Terra em meio à fortuna, as honras e todos os prazeres materiais, poder-se-á dizer que sofre a prova do arrastamento; para o que cai na desgraça por sua conduta ou sua imprevidência, é a expiação de suas faltas atuais e pode-se dizer que é punidopor onde pecou. Mas que dizer daquele que, após o nascimento, está a braços com as necessidades e as privações, que arrasta uma existência miserável e sem esperança de melhora, que sucumbe ao peso de enfermidades congênitas, sem ter ostensivamente nada feito para merecer tal sorte? Quer seja uma prova, quer uma expiação, a posição não é menos penosa e não seria mais justa do ponto de vista do nosso correspondente, porque se o homem não se lembra da falta, também não se lembra de haver escolhido a prova. Assim, há que buscar alhures a solução da questão. Como todo efeito em uma causa, as misérias humanas são efeitos que devem ter a sua; se esta não estiver na vida atual, deve estar numa vida anterior. Além disso, admitindo-se a Justiça de Deus, tais efeitos devem ter uma relação mais ou menos íntima com os atos precedentes, dos quais são, ao mesmo tempo, castigo para o passado e prova para o futuro. São expiações no sentido de que são consequência de uma falta e provas em relação ao proveito delas tirado. Diz-nos a razão que Deus não pode ferir um inocente. Assim, se formos feridos e se não somos inocentes o mal que sentimos é o castigo, a expiação, a maneira porque o suportamos é a prova. (...). Em resumo, se certas situações da vida humana tem, mais particularmente, o caráter de provas, outras, incontestavelmente, tem o de expiação, e toda expiação pode servir de prova”.
Por que os espíritas não louvam a Deus, diferente de outras religiões que adotam celebrações, cantos de louvor e veneração nos dias consagrados?
Porque o Espiritismo entende que o principal objetivo da religião não é a prática exterior da adoração, mas a ligação espiritual do homem com Deus, e isso ele deve fazê-lo, sobretudo, através de suas atitudes e atos no dia-a-dia de sua vida. Adorar é relativamente fácil; difícil é viver de acordo com o ideal do bem e da convivência fraterna. É claro que o Espiritismo não está condenando as práticas religiosas, que têm por finalidade o louvor, mas ele entende que Jesus valorizou muito mais a conduta das pessoas do que propriamente as práticas exteriores de religiosidade, conforme podemos ler nos evangelhos. Com isso ele quis combater a falsa religiosidade, que costuma se esconder atrás da adoração.
Basta leiamos o Sermão da Montanha, sobretudo os capítulos de 5 a 7 do Evangelho de Mateus, e ali vamos encontrar todas as suas recomendações em relação à prática da verdadeira religião que Jesus ensinou. Ele acabou entrando em conflito com os fariseus justamente por causa da religião exterior que muitos deles costumavam demonstrar; mas essas pessoas, que supervalorizavam a adoração, não tinham a religião interior; isto é, elas não se preocupavam com o próximo, tampouco faziam o bem, mas viviam egoisticamente, pensando apenas na própria salvação. E a religião interior é a consciência no bem, que se manifesta pela caridade – que é a forma prática do amor ao próximo.
Quando contou a parábola do Bom Samaritano, ele colocou três pessoas frente a frente com a necessidade do semelhante (o desconhecido que fora ferido na estrada). Essas três pessoas eram o sacerdote, o levita e o samaritano. Desses três, os mais religiosos – ou seja, os que mais participavam das celebrações do Templo – eram o sacerdote e o levita, justamente aqueles que não se compadeceram o homem caído e passaram sem socorrê-lo. Enquanto isso, o samaritano, que era considerado um herege, foi o único que agiu com amor em relação ao homem ferido. Com isso, Jesus quis dizer que o título religioso ou a forma de adoração não tem valor nenhum, se não estiverem apoiados sobre o verdadeiro sentimento de fraternidade.
Mesmo em relação ao rito da oferta, que o povo costumava fazer diante do altar, Jesus disse o seguinte: “Se estás para fazer a tua oferta diante do altar e te lembrares aí que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, depois vem fazer a tua oferta”. Ora, com essas palavras, ele deixa claro que mais importante que a oferta é o coração isento de mágoas ou ressentimentos, que mais importante que a adoração é a boa ação, pois é assim que se estabelece a verdadeira relação com Deus.
Por isso mesmo, ele completou: “Nem todo o que diz “Senhor! Senhor!” entrará no reino dos céus, mas somente aquele que fizer a vontade de meu Pai, que está nos céus”. A vontade de Deus é que todos se amem uns aos outros. Parece que, com isso, fica clara a posição de Jesus diante da questão da adoração e da ação. Observe que dessa forma ele contrariou a tradição milenar que, desde Moises, priorizava a adoração exterior, mas descuidava do aprimoramento moral do homem,para torná-lo um homem de bem.
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