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quinta-feira, 16 de outubro de 2014

REALISMO FANTÁSTICO OU REALIDADE PROVÁVEL ?

-“A experiência social na Terra vive tão distraída nos jogos de máscara, que a visita da verdade sem mescla, a qualquer agrupamento humano, por muito tempo ainda será francamente inoportuna”, comenta em mensagem psicografada por Chico Xavier, um industrial, administrador e homem público identificado, pela inicial G., por razões compreensíveis. A visão imediatista da vida em nossa realidade existencial certamente é a causadora dessa distorção compartilhada pela maioria das criaturas humanas que habita o planeta Terra. Mas, a, como ele diz, verdade sem mescla, representada pela morte aguarda a todos na esteira do tempo que vai se acumulando no nosso histórico de vida. As marcas do desgaste do revestimento chamado corpo físico se evidenciam na comparação imagem do espelho com a foto de anos atrás. Avaliado pelos critérios de nossa Dimensão como político e administrador de méritos indiscutíveis, G. não se sentia dessa forma após a transposição para outro Plano Existencial. Confessa que “não admitia que o sepulcro o requisitasse tão apressadamente à ‘meditação’. A angina, porém, espreitava-o vigilante, e fulminou-o sem que pudesse lutar. Recorda-se de haver sido arremessado a uma espécie de sono que não lhe furtava a consciência e a lucidez, embora lhe aniquilasse os movimentos. Incapaz de falar, ouviu os gritos dos seus e sentiu que mãos amigas lhe tateavam o peito, tentando debalde restituir-lhe a respiração. Não saberia precisar quantos minutos gastou na vertigem que lhe tomara de assalto, até que, em sua aflição por despertar, notou que a forma inerte o retomava a si, que sua alma entontecida regressava ao corpo pesado; no entanto, espessa cortina de sombra parecia interpor-se agora entre os seus afeiçoados e a sua palavra ressoante, que ninguém atendia... Inexplicavelmente assombrado, em vão pedia socorro, mas acabou por resignar-se à ideia de que estava sendo vítima de estranho pesadelo, prestes a terminar. Após alguns minutos de pavoroso conflito que a palavra terrestre não consegue determinar, teve a impressão de que lhe aplicavam sacos de gelo aos pés. Por mais verberasse contra semelhante medicação, o frio alcançava-lhe todo o corpo, até que não pude mais...Aquilo valia por expulsão em regra. Procurou libertar-se e viu-se fora do leito, leve e ágil, pensando, ouvindo e vendo. Contudo, buscando afastar-se, reparou que fio tênue de névoa branquicenta ligava sua cabeça móvel à sua cabeça inerte. Indiscutivelmente delirava – dizia de si para consigo -, no entanto, aquele sonho o dividia em duas personalidades distintas, não obstante guardar a noção perfeita de sua identidade. Apavorado, não conseguia maior afastamento da câmara íntima, reconhecendo, inquieto, que o vestiam caprichosamente a estátua de carne, a enregelar-se. Dominava-o indizível receio. Sensações de terror neutralizavam seu raciocínio. Mesmo assim, concentrou suas forças na resistência. Retomaria o corpo. Lutaria para reaver-se. Contudo, escoavam-se as horas e, não obstante contrariado, viu-se exposto à visitação pública. Mas, ele que se sentia singularmente repartido, observou que todas as pessoas com acesso ao recinto, diante dele, revelavam-se divididas em identidade de circunstâncias, porque, sem poder explicar o fenômeno, lhes escutava as palavras faladas e as palavras imaginadas. Muitas diziam aos seus familiares em pranto: - Meus pêsames! Perdemos um grande amigo... E o pensamento se lhes esguichava da cabeça, atingindo-o como inexprimível jato de força elétrica, acentuando: -“Não tenho pesar algum, este homem deveria realmente morrer”. Outras se enlaçavam aos amigos, e diziam com a boca: -“Meus sentimentos! O doutor G morreu moço, muito moço. E acrescentavam, refletindo: -“Morreu tarde...Ainda bem que morreu.. Velhaco! Deixou uma fortuna considerável... Deve ter roubado excessivamente”. Outras ainda, comentavam junto à carcaça morta: -“Homem probo, homem justo!...E falavam de si para consigo: -“Político ladrão e sem palavra! Que aterra lhe seja leve e que o inferno o proteja!”.(...). Humilhado, aguardei paciente as surpresas da nova situação. Estava inegavelmente morto e vivo. O caixão não favorecia qualquer dúvida. Curtia dolorosas indagações, quando, em dado instante, arrebataram-me o corpo. Achava-me livre para pensar, mas preso aos despojos hirtos pelo estranho cordão que eu não podia compreender e, em razão disso, acompanhei o cortejo triste, cauteloso e desapontado. A vizinhança do cemitério abalava a escassa confiança que passara a sustentar em mim mesmo. O largo portão aberto, a contemplação dos túmulos à entrada e a multidão que me seguia, compacta, faziam-me estarrecer. (...). Clamei debalde por socorro, até que, com os primeiros punhados de terra atirados sobre o esquife, caí na sepultura acolhedora, sem qualquer noção de mim mesmo”. Diante de tão minuciosa narrativa deixamos com você a pergunta: - Realismo fantástico ou realidade provável?


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