Abrindo o número de março
de 1865 da REVISTA ESPÍRITA,
seu editor Allan Kardec apresenta interessante matéria com a qual procura
descaracterizar a fantasia sustentada durante séculos pelas principais
religiões existentes na Terra. Entre os ponderados argumentos sobre a razão
pela qual se sustentou durante tanto tempo essa ilusão, não se acessando desde
o princípio a compreensão da lógica exposta pelo – então nascente -
Espiritismo, diz: -“Pela mesma razão que não se ensina à criança o que se lhe ensina na
idade madura. A revelação restrita era suficiente durante certo período da Humanidade;
Deus as adequa proporcionalmente às condições evolutivas do Espírito. Os que
hoje recebem uma revelação mais completa são os mesmos Espíritos que noutros
tempos receberam apenas uma parcela, mas que depois cresceram em inteligência. Antes
que a ciência lhes tivesse revelado as forças vivas da natureza, a constituição
dos astros, o verdadeiro papel e a formação da Terra, teriam compreendido a
imensidade do espaço, a pluralidade dos mundos? Teriam podido identificar-se
com a vida espiritual? Conceber, depois da morte, uma vida feliz ou infeliz, a
não ser num lugar circunscrito e sob uma forma material? Não: compreendendo
mais pelos sentidos do que pelo pensamento, o Universo era demasiadamente vasto
para seu cérebro; era preciso reduzi-lo a menores proporções, para o por em seu
ponto de vista, livre de o ampliar mais tarde. Uma revelação parcial tinha sua
utilidade, então; era sábia; hoje é insuficiente. O erro é daqueles que, não
levando em conta o progresso das ideias, creem poder governar homens maduros
com os andadores da infância”. Associado à ideia de felicidade, o
chamado CÉU apregoava-se ser destinado a acolher os “bem-aventurados”.
Entende Kardec que “o
erro das diversas doutrinas concernente à morada dos “eleitos”, devia-se a um
duplo erro: 1- que a Terra era o Centro do Universo e, 2 – que a região dos
astros era limitada. “Foi – diz ele -, para além desse limite imaginário
que todas colocaram a morada feliz e a morada do Todo Poderoso (...). Com a
inexorável lógica dos fatos e da observação, a Ciência levou seu facho até as
profundezas do espaço e mostrou a ingenuidade de todas essas teorias. A Terra
já não é o pivô da Universo, mas um dos menores astros rodando na Imensidade; o
próprio Sol não passa de um centro de um turbilhão planetário; estrelas são
inumeráveis sóis, em torno dos quais circulam mundos incontáveis, separados por
distâncias apenas acessíveis ao pensamento, posto de parece tocar-se. Nesse
conjunto, regido por Leis eternas, nas quais se revelam a sabedoria e a
Onipotência do Criador, a Terra não aparece senão como um ponto imperceptível e
um dos menos favorecidos para a habitabilidade. Desde então se pergunta por que
Deus a teria feito como única sede da vida e para aí teria relegado suas
criaturas prediletas. Ao contrário, indica que a vida está por toda parte, que
a Humanidade é infinita como o Universo. Revelando-nos a ciência, mundos
semelhantes à Terra, Deus não os podia ter criado sem objetivo. Deveria tê-los
povoado por seres capazes de os governar. As ideias do homem estão na razão do
que sabe. Como todas as descobertas importantes, a da constituição dos mundos
lhe deve ter dado um outro curso. Sob o império desses novos conhecimentos,
suas crenças devem ter-se modificado. O Céu foi deslocado; a região das
estrelas, não tendo limites, não mais lhe pode servir. Onde está ele? Ante tal
questão todas as religiões ficam mudas. Num texto irretocável em que
vai construindo um raciocínio que brilha pela seu conteúdo, indaga, a certa
altura: -“Nesta imensidade sem limites, onde, pois, está o CÉU?”, para
ele mesmo responder: -“Por toda parte; nenhum muro o limita; os
mundo felizes são as últimas estações que a ele conduzem, as virtudes lhes
abrindo caminho e os vícios lhes barrando o acesso”. Enfatiza a
importância da visão evolucionista revelada pelo Espiritismo; as
duas faces da vida – a material e a espiritual – funcionando como instrumento
de progresso do princípio inteligente individualizado; a felicidade dependendo
das qualidades próprias dos indivíduos e não do estado material do meio em que
se acham, estando por toda parte onde haja Espíritos capazes de ser felizes,
não havendo nenhum lugar circunscrito no Universo; não sendo a felicidade
pessoal, mas, traço de união resultante da similitude de ideias, gostos,
sentimentos, formando grupos ou famílias homogêneas, no seio das quais cada
individualidade irradia suas próprias qualidades e se penetra dos eflúvios
serenos e benéficos, que emanam do conjunto, cujos membros, tanto se dispersam
para se darem às suas missões, tanto se reúnem num ponto qualquer do Espaço
para comunicar o resultado de seus trabalhos, ou se reúnem em torno de um
Espírito de ordem mais elevada, para receber conselhos e instruções”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário